segunda-feira, 30 de março de 2015

Distância


A história de dois jovens que se rencontram e se perdem em uma mesma noite, aquela terrível noite que o destino preparou para eles, poderia ter sido tudo diferente se... Não, o “se” não existiu para eles.

Imagem da Internet

A semana tinha sido dura para Sarah, muitas aulas e muitos trabalhos, nem mesmo o final de semana seria livre. A faculdade vinha tomando conta de todo o seu tempo, estava sendo difícil, mas estudar veterinária sempre tinha sido seu sonho, não desistira. Se fosse necessário dormir duas por dia, assim faria.
Depois de muito estudo e ter concluído seus três trabalho para a semana que viria, Sarah decidiu ir até o quintal e olhar um pouco o céu, aquele finalzinho de tarde estava encantador e ficar ali parada sem fazer nada era tudo o que ela buscava a semana inteira.
Seu celular tocou, e no visor apareceu a foto de Luana sua amiga, elas se conheceram ali na faculdade e mesmo sendo diferentes em muitas coisas, se davam bem.
Sarah: Alô?
Luana: Sarah! (uma voz muito animada) Temos uma festa para ir hoje!
Sarah: O que? Hoje?
Luana: Sim, vai ser demais, muita gente de varias faculdades da cidade.
Sarah: Ah não Luana, hoje e eu tenho tantas coisas para fazer ainda. Sem falar que amanhã acordamos cedo. Deixa para outro dia.
Luana: Não acordamos nada e outro dia não terá essa festa, pelo amor de Deus Sarah você passou a semana e o final de semana todo com a cara nos livros. Vamos nos divertir!
Sarah: Desculpa, mas eu realmente não acho uma boa idéia.
Luana: Poxa, não fazemos nada a dias, quando de repente surge essa festa maravilhosa. Uma  oportunidade quase única de nos divertir você faz isso. Serio, vamos por favor, juro que não te peço mais nada! Por favor!
(suspiro cansado) 
Sarah: Tudo bem, mas vamos voltar cedo.
Luana: Ahhhh! Combinado, passo ai meia noite.
Sarah não queria mesmo ir, ela queria aqueles momentos sozinha, mas Luana tinha razão elas não saiam a tanto tempo, por ela tudo bem, mas a amiga era louca por festa e se continuasse mais tempo presa, enlouqueceria.
Com tempo de sobra, terminou seus afazeres e se arrumou para a festa. Antes de sair decidiu ligar para os pais, que estavam jantando fora para avisar que estava saindo, Sarah sabia que seus pais preferiam que ela ligasse ao invés de deixar um recado na geladeira. 
A meia noite uma buzina estridente começou soar na sua porta. Era hora de ir.
Quando chegaram ao local da festa, Sarah viu diversas pessoas na porta para entrar, e concluiu que aquela era de fato a festa do ano. Já dentro da festa tudo estava um loucura, parecia que ali tinha muito mais gente do que caberia.
Encostada em um dos balcões enquanto aguardava sua bebida, Sarah ouviu alguém chamar seu nome, parecia loucura dentro dessa boate lotada, ela ouvir qualquer coisa, mas aquela voz. Ela jamais esqueceria aquela voz.
Nicolas: Ei Sarah? Sarah é você?
Ela virou o corpo em direção à mão que encostava em seu ombro, e finalmente depois de quatro estava cara a cara com o garoto que havia partido e partido também seu coração.
Sarah: Nicolas? Nossa...
Nicolas: É eu sei, já faz muito tempo.
Sarah: Sim...
Sarah não sabia dizer o que sentia naquele momento, seu coração parecia bater mais alto que o som da banda que tocava no palco. Nicolas parecia ao mesmo tempo diferente, mas também tão igual ao garoto por quem se apaixonou no colégio.
Nicolas sabia que reencontrar Sarah seria algo difícil, mas ele esperava por isso desde o dia que foi embora. Ela continuava linda e ele pelo visto apaixonado. Eles se encaravam e Nicolas percebeu ali que depois de quatro anos não queria mais esperar nem quatro minutos para dizer a ela.
Nicolas: Sarah, eu nem sei como cheguei aqui de tão ansioso que eu estava, eu estava parado na sua porta pensando em tudo que eu queria dizer, quando seus pais chegaram e disseram que você estava aqui com uma amiga da faculdade, eu acho que nem agradeci eles e vim correndo para cá. Precisava te dizer que...
Luana: Sarah!!! (grito animado) Isso aqui está demais. Ainda bem que viemos, está cheio de caras gatos e, quem é esse?
Sarah um pouco sem jeito com amiga, sabe que não tem muita escapatória.
Sarah: Luana, esse é o Nicolas, Nicolas essa é a minha amiga Luana.
Nicolas: Prazer Luana.
Luana encara a amiga
Luana: Nicolas? O seu Nicolas?
Sarah: Não Sarah, esse é o Nicolas meu ex-namorado.
Luana: Ah entendi, me desculpe, eu não queria interromper. Na verdade vim só te chamar para dançar comigo lá na frente do palco.
Sarah: Eu já vou, só estou aguardando minha bebida, como está um pouco cheio, está demorando.
Luana: Certo, vou indo, depois nos falamos. Prazer Nicolas.
Luana sabe que a amiga não vai mais dançar com ela, sem querer ela tinha levado Sarah para a melhor noite da sua vida.
Sarah: Desculpe pela Luana, ela é assim mesmo. Nem precisa de bebida.
Nicolas: Tudo bem Sarah, só por favor não vá dançar com ela antes de me ouvir.
Sarah: Pensei que já tínhamos dito tudo um ao outro.
Nicolas: Você disse, eu não pude nem implorar para as coisas serem diferentes.
Sarah: Nem poderia.
Nicolas: Sarah, por favor deixe eu falar. Eu nunca quis que acabasse, eu teria agüentado a distancia se você ao menos tentasse , porque eu te amava o suficiente para isso.
Sarah: Você acha que eu não te amava?
Nicolas: Não sei, você desistiu de nós. Você rompeu o nosso acordo o que você queria que eu pensasse?
Sarah: Aqui não é lugar para discutir isso.
Nicolas: Não, não é. E eu também não quero discutir sobre isso, não quero mais saber do passado se você me quiser no seu futuro.
Sarah: O que?
Nicolas: Eu te amo Sarah, sempre amei. E quero fica só com você se você me quiser. Não quero reclamar do passado, você teve seus motivos e tudo bem se você me disser que ainda pode me amar.
Sarah: Nicolas, eu não sei o que te dizer.
Nicolas: Você pode voltar a me amar?
Aquele momento parecia ser uma ilusão, mais um sonho daqueles que ela tem com ele. No meio daquele lugar tumultuado o cara que foi embora, volta querendo um futuro com ela. Isso parecia alguma peça que queriam pregar nela. Mas ele estava ali, tentando uma reaproximação, seria ela capaz de resistir? Ela poderia amá-lo mais uma vez? E é verdade que algum dia ela deixou de ama-lo? Não, definitivamente ele vem consumindo seus pensamentos desde o dia em que se viram pela primeira vez no colégio.
Sarah: Nicolas a verdade é que não, eu não posso voltar a te amar, não tenho como fazer isso... se nunca deixei de pensar em você nem se quer por um segundo.
Nicolas a tomou em seus braços e a alegria que os tomou naquele momento preencheu todo o vazio daqueles quatro ano e naquele momento a certeza de que ficariam juntos dali por diante era tudo que ele precisavam.
O momento mágico que Sarah e Nicolas viviam no lugar mais improvável, foi inrterrompido por um grito muito estridente vindo do palco.
Pessoa: Fogo!!! Está pegando fogo!!! Socorro!
Sarah e Nicolas avistaram um brilho vindo do palco que parecia crescer cada vez mais. Era fogo, a boate estava pegando fogo. Por um instante Sarah via tudo em câmera lenta, pessoas desesperada gritavam e corriam para todos os lados enquanto aquele brilho devastador crescia descontroladamente.
Nicolas: Sarah, Sarah, Sarah, me escuta, ei, precisamos sair daqui agora, o fogo já está chegando perto da gente e se você se concentrar em mim, vamos conseguir sair. Sarah!
Sarah: Nicolas, a Luana!
O desespero toma conta da menina, e Nicolas tentando se manter calmo tenta conte-la.
Nicolas: Sarah, precisamos chegar até porta está vendo? Talvez a Luana já esteja lá e caso não esteja e volto pra buscar ela. Agora vamos!
Nicolas sai arrastando Sarah pela a boate, em questão de segundo o fogo tomou conta de tudo, Nicolas tenta proteger Sarah, seu objetivo ela apenas tira-lá dali. Muitos corpos caídos no chão, começa atingir a barreira de sanidade que ele criou, apertando Sarah contra seu corpo, Nicolas se apressa até a saida quando a fumaça densa do fogo começa a fazer pressão em seu peito, Nicolas e Sarah começam a tossir muito e a caminha até a saída está cada vez mais difícil.
Mas Nicolas precisa salvá-la, muita gente aglomerada tentam alcançar a saída principal, parecia ser na verdade a única saída. O tempo estava ficando cada vez mais curto, Nicolas empurra as pessoas em um ato desesperado. Um segurança segura o braço de Sarah impedindo sua saída.
Segurança: Ei moça, precisa pagar sua conta.
Nicolas: O que?! Esta tudo pegando fogo! Pessoas estão morrendo aqui dentro e você quer que paguemos a maldita conta!? Cala essa boca e deixa ela sair porra!
Segurança: Eles já estão contendo o fogo rapaz, pague a conta da sua namorada e ela poderá sair.
Nicolas: Tudo bem, eu pago! Agora deixa ela sair agora!
O segurança da abertura para Sarah sair, ela tosse muito e seu rosto está sujo por causa da fumaça pesada.
Nicolas: Sarah vai, sai logo.
Sarah: Não sem você.
Nicolas: Estou indo logo atrás, só vou buscar a Luana. Agora Sai.
Eles se olham mais uma vez e Sarah foge. Uma olha para trás e Sarah vê que as pessoas lá dentro estão cada vez mais desesperada. Gritos assustadores saem de dentro da boate e com lagrimas escorrendo Sarah cai de joelhos implorando a Deus que salve aquelas pessoas.
Sarah: Nicolas, por favor, por favor, sai... (chorando muito)
Dentro da boate Nicolas já sem forças juntos com outros conseguem empurrar o segurança e possibilitar a saída das pessoas barradas.
Voz: Socorro, alguém me ajuda!
Nicolas ouve um pedido de ajuda, e avista uma garota caída no chão tossindo muito, ele tem ali em sua frente a chance de sair vivo, é só ignora aquela voz, ninguém saberia. Ele não conseguia ser egoísta como aquele segurança, aquela menina pode ser a Sarah de alguém.
Nicolas corre em direção a voz, e percebe que tem uma madeira pesada sobre a perna da jovem, ele retira a madeira e ajuda a menina se levantar.
Nicolas: Temos que ser rápido. Por aqui, vai corre. A porta está a sua esquerda.
Do lado de fora, Sarah vê uma menina mancando sair, desesperada ela começa a gritar por Nicolas
Sarah: Nicolas!!! Nicolas!!! Sai daí, por favor! Nicolas!!! Nicolas!!! Não faz isso comigo!!!
Do lado de dentro Nicolas está caído no chão, com a respirando em frangalhos sabe que não tem mais tempo para ele, a madeira que atingiu suas costas enquanto tentava sair o prejudicou ainda mais. Não podia ser verdade aquilo, não podia terminar assim, ele não podia ao menos se despedir dela? Com a respiração e o coração pesado, enfiou a mão do bolso e dali tirou seu velho celular, era sua ultima chance, torci para que o numero ainda fosse o mesmo.

Uma semana depois

Em todo o mundo se ouvia falar sobre o incêndio, sobre as mortes, sobre os sobreviventes, sobre aquela terrível madrugada onde Sarah perdeu a pessoa que mais amou. Onde também perdeu uma grande amiga, onde descobriu mais tarde que outros colegas de turma se foram também. Esses últimos dias foram os mais difíceis que já viveu, não sabia que ser sobrevivente era tão mais doloroso, preferia ser um dos vários mortos, afinal, está morrendo todos os dias um pouco. Seu celular apita mais uma vez, e uma outra vez ela ignora. Não queria falar com ninguém, não queria ir à psicólogos, funerais, igrejas, não queria fazer mais nada. Só queria ficar ali deitada, chorando para o resto da sua vida. O celular apita mais uma vez e desligar lhe parecia a idéia perfeita. Pegou o aparelho e antes de desligar, olhou o aparelho e viu que só tinha ali uma mensagem de voz. Nunca foi de ouvir essas mensagens, porque nunca foi de receber, mas algo ali lhe fez sentir um calafrio. Ela precisava ouvir, era a única coisa que ela sabia naquele momento.
“Oi (respiração pesada), espero que esse seja seu numero ainda, vou me agarrar a essa esperança por que o que mais eu tenho?. Acho que a essa altura você sabe que não consigo sair, e não tem como ninguém vim aqui me ajudar. Olha (tosse, muita tosse), eu não queria que fosse assim, me sinto tão frustrado agora, sinto que vivi quatro anos inutilmente, eu poderia estar com você passeando pela cidade, conhecendo outros lugares, vivendo a nossa vida. Como eu fui estúpido não é? Agora não tenho mais tempo... mas de tudo isso penso em coisas boas, como seu sorriso, seus olhos, suas mãos, nas suas palavras essas ultimas que me disse, eu também não consegui deixar de pensar em você eu sinto muito, sinto muito mesmo, não queria ter de ir embora de novo, não queria te deixar, não queria ter que me despedir assim, não queria ir, mas (tosse, muita tosse) eu acho que não posso fazer mais nada quanto a isso, espero que não fique com raiva de mim, e tudo bem romper nosso acordo dessa vez, essa distância é maior do que podemos aguentar, eu estou indo Sarah e não vou poder mais voltar ...”


Sim, uma noite como essa aconteceu. 27 de Janeiro de 2013 uma festa na boate Kiss em Santa Maria no Rio Grande do Sul terminou em uma triste tragédia, em que 240 pessoas morreram, não existiu a história de nenhum Nicolas e nenhuma Sarah, mas muitas histórias foram interrompidas naquela noite, muitas vidas foram perdidas, muitas pessoas mesmo as que sobreviveram aquela tragédia tiveram um pedaço seu levado, e a lembrança daquela noite jamais saíra de nossos corações.   

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